domingo, 19 de novembro de 2017

Esclarecendo os conceitos: bi amplificação e bi cabeamento



Na última postagem, falamos sobre os divisores de frequência ativos e passivos, utilizados para efetuar a separação de freqüências necessária para a correta operação dos alto-falantes. Vimos também que existe uma melhoria significativa de qualidade ao se utilizar cross-overs ativos em projetos mais sofisticados. Essa melhoria cobra seu preço em termos de complexidade e custo da instalação, com o uso de um cross-over ativo e de mais amplificadores por canal. A solução ativa não é vista em Home-theater, ainda tem pouca visibilidade em sistemas estéreo, mas é comum em sistemas profissionais, seja nos PA’s (Public Address ou em sistemas para shows), como também em estúdios de gravação. Caixas do tipo monitor de estúdio são invariavelmente bi ou tri amplificadas e possuem cross-overs ativos, sendo que algumas utilizam DSP´s (Digital Signal Processors), que além de proporcionar maior precisão nos filtros, trazem recursos adicionais construídos no software do DSP, que se somam aos benefícios anteriores. Equalização das curvas de resposta, correção das deficiências dos alto-falantes e alinhamento temporal são apenas algumas das vantagens desse conceito.

O mundo do áudio residencial tem aplicado pouco os cross-overs ativos, mas existem produtos para uso com bi amplificação ou ainda com bi cabeamento. Qual a diferença entre eles? A complexidade adicional resultante também vale o benefício?

Bi cabeamento

Vamos começar pelo bi cabeamento. Antes de continuar, por simplicidade de notação, falaremos de bi cabeamento ou bi amplificação, mas os conceitos podem ser estendidos para três ou mais vias da mesma forma, ou seja, para tri cabeamento ou tri amplificação e assim sucessivamente.

Nessa configuração utiliza-se um amplificador, que é conectado a uma caixa acústica que permite bi amplificação (ou seja, esta tem quatro terminais, dois para ligar a via de graves e dois para ligar a via de agudos), através de um par de cabos. Dessa forma, o sinal de baixa frequência que está disponível na saída do amplificador trafega até a caixa pelo cabo conectado à entrada de graves e o sinal de médias e altas freqüências trafega até a caixa pelo cabo de médios e agudos. Ou seja, o cabo que conduz os graves não conduz médios e agudos e vice-versa.  A vantagem da configuração, dizem, é que há menos interação entre os sinais que trafegam em cabos separados. Será isso realmente procedente ou será apenas mais uma dos grandes mitos do áudio?

Apesar de existirem pessoas que acreditam realmente que há uma pequena melhora na qualidade da reprodução assim obtida, o fato é que a diferença, se existir, é pequena e difícil de ser notada. A questão é que, do ponto de vista de engenharia, levar o sinal por um cabo ou por dois cabos da forma apresentada acima não gera nenhuma alteração do ponto de vista elétrico e, portanto, acústico, a não ser que o cabo esteja mal dimensionado ou for de baixíssima qualidade. Logo, alterações para melhor são difíceis de justificar.  Fisicamente sabe-se que cabos são elementos bastante lineares. Portanto, não faz diferença alguma, do ponto de vista elétrico, usar um cabo ou dois cabos saindo do mesmo amplificador e chegando à mesma caixa acústica. Na realidade, bi cabeamento não produz melhora. Mas também não provoca piora. É uma técnica inócua. A melhora, se existir, é sutil e geralmente inaudível.

Já o caso da bi amplificação é outra história. Existem dois tipos de bi-amplificação: a passiva e a ativa. 

 Bi amplificação ativa

Conforme discutimos anteriormente, bi amplificação ativa envolve o uso de um crossover ativo que divide o espectro do sinal de áudio em baixas e altas freqüências. Isso ocorre antes dos amplificadores, e consequentemente permite que cada canal do amplificador somente receba e reproduza as freqüências destinadas a ele. Com isso, eliminam-se os cross-overs passivos das caixas, o que já causa alguma melhora. O fato de cada amplificador estar diretamente conectado ao alto-falante faz com que a carga vista por ele seja muito mais bem comportada do que a anterior, com o cross-over passivo instalado entre o amplificador e o alto-falante. Isso porque crossovers passivos são cargas reativas, que não são bem gerenciadas pelos amplificadores e também possuem perdas, o que faz com que o amplificador “sofra” um pouco mais para acionar o sistema e esteja mais propenso a produzir distorção. O sistema também se torna mais eficiente, uma vez que as perdas são menores. Mas o grande benefício da técnica é dado pela redução da distorção no amplificador, que só tem que amplificar uma parte do espectro audível. Além disso, se forem utilizados dois amplificadores iguais para a função, o volume percebido pela potência maior será bastante nítido. 

A separação dos sinais ainda permite um ganho de potência que teoricamente pode chegar a três dB´s, dependendo de como o sinal musical é composto, fazendo com que a impressão sonora chegue (teoricamente) ao dobro da anterior. Na prática, esse ganho pode chegar a um ou dois dB´s no máximo. Esse assunto é um pouco complexo para ser explicado nesta coluna, portanto não vamos discutí-lo em detalhes.  Todos os benefícios  descritos, se somados, resultam em real melhoria de qualidade, em troca de um custo adicional. 

Bi amplificação passiva

A bi amplificação passiva utiliza os cross-overs passivos das caixas acústicas que dispõem dos conectores separados para a parte alta e a parte baixa do espectro sonoro. Nesse caso, cada canal do amplificador amplifica o sinal completo, que alimenta a parte de graves ou de agudos da caixa utilizada.

Os benefícios são menos pronunciados do que no caso anterior, mas existem. A grande vantagem deste método é que cada amplificador enxerga em seus terminais somente parte da carga que ele veria no caso normal. Por exemplo, um amplificador conectado à via de agudos, nessa condição, não veria a via de graves como carga, o que melhora a solicitação de potência sobre ele, fazendo-o trabalhar numa situação mais confortável. As vantagens dessa configuração são basicamente a menor distorção gerada pelo amplificador e o ganho de potência, pois estão se utilizando duas unidades amplificadoras iguais. Os amplificadores trabalharão um pouco mais folgados, pois não terão a necessidade de fornecer potência em todo o espectro audível.

Bi amplificação mista

Trata-se de uma configuração bastante vista, onde o canal de graves tem um cross-over ativo e o canal de médios-agudos também tem um crossover ativo, porém a separação entre médios e agudos é feita por meio de um crossover passivo. A vantagem imediata é que os graves, que demandam mais potência, são alimentados por um amplificador independente e os médios-agudos por outro. Com isso obtém-se os ganhos citados anteriormente sem a complexidade produzida por um sistema tri amplificado.

Bi amplificação Horizontal e Vertical

A bi amplificação horizontal e vertical pode ser aplicada tanto ao caso passivo quanto ao caso ativo. No caso horizontal, um amplificador é utilizado para acionar a parte de alta freqüência do sistema, enquanto outro amplificador é usado para a parte de baixa freqüência do sistema. O benefício imediato é que se especificar amplificadores que trabalhem melhor com o canal de graves ou com o canal de agudos, através da seleção deles com base em seus parâmetros e potências. No caso vertical, os dois canais de um mesmo amplificador são utilizados para empurrar tanto a parte alta quanto a parte baixa do mesmo canal. Nesse caso, perde-se a oportunidade de escolher amplificadores que se adequem melhor às necessidades do canal de graves ou de agudos, mas pode-se trabalhar com o amplificador numa situação um pouco mais tranquila, dado que o canal de agudos exige menos potência do amplificador.

Existem mais detalhes sobre o assunto, que é um pouco complicado. As vantagens da bi amplificação ativa são significativas, especialmente se utilizadas com a configuração horizontal. A complexidade resultante é maior, mas os benefícios são consistentes e audíveis. No mundo profissional, este método é bastante utilizado. Quem tiver curiosidade de saber como se comporta um sistema desses, visite uma loja especializada em áudio profissional e peça para ouvir uma caixa monitor de estúdio ativa. No mercado de áudio automotivo, temos notado a disseminação do uso, mas no mercado residencial ainda são poucos os que o adotam. Em home-theater, a complexidade adicional gerada pelos amplificadores necessários para os diversos canais de um sistema típico multicanal ainda deve manter a bi amplificação longe desse mercado, mas em sistemas estéreo com 2.1 canais ele é perfeitamente realizável, ao custo de um pequeno aumento de complexidade. 

Os divisores de frequência ( ou crossovers) ativos e passivos e aplicações



Em nossa última postagem falamos sobre a quantidade de vias das caixas acústicas e da necessidade de dividir o espectro sonoro para cada uma dessas vias. Vimos também os arranjos mais comuns utilizados nas caixas do tipo bookshelf e nas do tipo torre. O trabalho de dividir o espectro sonoro em partes é feito por um circuito eletrônico chamado de divisor de freqüência (ou crossover, em inglês). Um crossover é definido basicamente pelo número de vias, pela freqüência (ou freqüências) de corte e pela taxa de atenuação em função da frequência.  Os dois primeiros itens foram abordados na coluna do mês passado. Vimos, por exemplo, que uma caixa bookshelf típica tem duas vias e uma freqüência de crossover entre 2 e 4 kHz (na coluna anterior afirmamos que essa freqüência estava entre 3 e 4 kHz, porém a faixa entre 2 e 4 kHz é mais utilizada na prática). A taxa de atenuação nos diz quanto do sinal não desejado é atenuado em função da frequência, conforme esta se afasta do ponto de transição. Essa taxa é um quesito definido no projeto da caixa acústica e afeta diretamente a complexidade e o custo do crossover.

Os divisores de frequência se dividem em dois tipos: os ativos e os passivos. Os divisores passivos são o tipo mais comum encontrado em caixas para Home-theater, à exceção dos subwoofers, que usam filtros ativos em sua eletrônica. Falaremos mais sobre os detalhes de subwoofers em uma coluna futura.  Já os divisores ativos são bastante utilizados em sistemas de áudio profissional e ultimamente também tem sido vistos com frequência em instalações automotivas, mas seu uso é restrito em sistemas residenciais.

Os divisores passivos usualmente fazem seu trabalho escondidos do usuário de sistemas residenciais: eles ficam colocados no interior das caixas acústicas ou arandelas para Home-theater, posicionados entre a saída do amplificador e os alto-falantes. Disso resulta um sistema muito simples, onde um amplificador por canal dá conta do recado.

Produtos mais simples utilizam crossovers chamados de primeira ordem ou de 6 dB/8ª, o que significa que o sinal é atenuado em 6 dB´s a cada oitava para cima ou para baixo na freqüência a partir do ponto de crossover, dependendo da via considerada. Por exemplo, para um tom de 1 kHz, uma oitava abaixo é 500 Hz e uma oitava acima é 2 kHz. O Decibel ou dB é uma unidade logarítmica que neste caso indica a atenuação do sinal. Quanto maior esse número maior a atenuação do crossover.  

Divisores de 6 dB/8ª são simples e, portanto vistos em produtos baratos. Apesar de apresentarem algumas vantagens, como melhor comportamento temporal, eles fazem com que os alto-falantes reproduzam a mesma frequência por um longo pedaço do espectro audível, dada a baixa atenuação. Isso pode ser ruim, pois em função da construção da caixa as frequências podem se adicionar ou se subtrair, gerando picos ou vales na resposta em frequência. Mas o pior problema de crossovers de primeira ordem é que os tweeters acabam recebendo muita energia em baixa freqüência (que eles não deveriam estar recebendo) e, portanto, estão mais sujeitos a serem danificados por excesso de potência em freqüências não desejadas.

Os filtros mais utilizados atualmente são os de 12 dB/8ª ou de 2ª ordem. A complexidade aumenta um pouco, mas a atenuação nas frequências que o alto-falante não trabalha dobra. Logo, o principal problema, que é o excesso de potência em freqüências baixas que chegam ao tweeter, é minimizado. Este tipo de crossover é de longe o mais utilizado, pelo compromisso entre complexidade, atenuação e custo obtidos. Um crossover de 18 dB/8ª ou 24 dB/8ª já se torna muito complexo para ser implementado de forma passiva.

Os crossovers passivos são construídos utilizando capacitores, indutores e resistores, que por estarem na saída do amplificador são itens de tamanho grande e tem custo elevado. Um crossover de primeira ordem e duas vias é bastante simples, podendo ser construído com apenas dois componentes. Já os de 2ª ordem e duas vias necessitam de ao menos quatro componentes.  Caso o número de vias passe de duas para três, o número mínimo de componentes aumenta para quatro para o de primeira ordem e oito para o de segunda ordem. Filtros com ordem e número de vias maiores logo chegam a uma complexidade de projeto considerável e a um número de componentes elevado, o que se reflete na construção e no custo. Logo, crossovers passivos geralmente são compostos de filtros de 2ª ordem com duas vias, chegando no máximo a até quatro vias.   

 Já nos sistemas ativos, os crossovers ficam colocados antes dos amplificadores, de forma que cada via tem de ter seu próprio amplificador, que está ligado diretamente no alto-falante. Esses sistemas são também chamados de bi amplificados (aqueles com duas vias ativas) ou tri amplificados (aqueles com três vias ativas) e assim por diante. A complexidade adicional resultante de um sistema bi ou tri amplificado inibe bastante a aplicação de sistemas ativos em Home-theater, onde o número de canais é de pelo menos cinco.

Porém, com crossovers ativos, as limitações citadas acima desaparecem, pois os filtros estão colocados antes do amplificador e podem ser realizados de forma analógica com componentes de pequeno porte e através de circuitos ativos, que apresentam melhor desempenho e precisão. Além disso, eles podem ser construídos com taxas de 24 ou até 48 dB/8ª, que são filtros excepcionais, com bastante atenuação fora da banda desejada. Alternativamente, os filtros podem ser construídos de forma digital, e implementados através do uso de um microprocessador dedicado chamado de DSP (Digital Signal Processor ou Processador Digital de Sinais). Crossovers digitais são precisos, versáteis e podem ter a ordem e a atenuação que se desejar. Através do software de controle, é possível se modificar a frequência de corte, a taxa de atenuação e até a ordem do filtro de forma simples.

Os circuitos ativos trazem consigo o aumento do número de amplificadores. O crossover fica muito melhor, mas a complexidade do sistema resultante aumenta. No mundo profissional, o ganho de desempenho é amplamente compensado, de forma que o aumento da complexidade não é relevante.

Para finalizar a postagem, devo citar que bi amplificação não é a mesma coisa que bi cabeamento. O último é uma técnica que usa somente um amplificador e cabos separados para alimentar as seções de graves e agudos da caixa acústica. Os resultados são significativamente diferentes dos obtidos com bi amplificação. Mas isso fica para a próxima postagem do blog. Até mais!



domingo, 9 de julho de 2017

Continuando nossa discussão sobre caixas acústicas - mais sobre alinhamentos e vias



Em março passado escrevi sobre a importância dos gabinetes e sobre os principais tipos de alinhamento das caixas acústicas, como a caixa dutada (ou refletora de graves), a caixa selada (ou suspensão acústica), a caixa utilizando o radiador passivo e a caixa do tipo defletor infinito, que é de onde vem o alinhamento obtido com arandelas de teto e alto-falantes para embutir em parede. Ficaram faltando alguns alinhamentos menos usados, como a caixa em linha de transmissão, o tipo isobárico e os tipos band-pass.

O alinhamento do tipo linha de transmissão é o único desses que discutiremos um pouco mais. Nesse caso, a onda sonora traseira do alto-falante é conectada a um duto (que pode ser também um labirinto), preenchido com material absorvente. O material absorvente tem por objetivo dissipar a onda traseira do alto-falante ao longo do duto ou labirinto. Na prática, parte da onda que não é absorvida pode ou não ser usada para reforçar os graves. Devido ao fato de que o comprimento da linha de transmissão deve ser uma fração específica do comprimento de onda da frequência mais baixa que será reproduzida, linhas de transmissão para graves tendem a ser bastante longas. No caso de drivers para médios e agudos o comprimento da linha é bastante reduzido. A carga apresentada pela caixa em linha de transmissão é mais uniforme, especialmente na região de ressonância, melhorando o amortecimento do alto-falante, com o benefício adicional de que a parte não dissipada na linha de transmissão pode ser utilizada para reforçar a onda frontal. Caixas com esse alinhamento produzem graves que chegam a valores bastante baixos em freqüência e também possuem bastante clareza e definição, além de baixa distorção. O grande problema da linha de transmissão é o custo e tamanho da caixa, que são maiores que os outros tipos. Isso limita o uso comercial desse alinhamento, que pode ser visto em produtos mais caros e onde o espaço ocupado não é uma preocupação.

Conforme comentamos em um de nossos textos sobre alto-falantes e caixas acústicas, estas devem incorporar mais de um alto-falante para a correta reprodução do espectro sonoro audível pelo ouvido humano. A quantidade de vias é dada pelo número de freqüências que são separadas para excitar os alto-falantes do sistema, por um circuito interno da caixa chamado de cross-over. Vimos que uma caixa de boa qualidade possui uma combinação de alto-falantes dinâmicos de diversos tamanhos para conseguir responder desde os graves mais baixos até o extremo agudo do espectro de frequências audíveis. Um woofer, que é um alto-falante de maior tamanho, é utilizado para reproduzir os sons graves. Um tweeter é utilizado para reproduzir as frequências médias e agudas. Em caixas mais sofisticadas utiliza-se um terceiro alto-falante para a reprodução dos sons médios, como a voz humana, de tamanho intermediário.

Uma caixa de duas vias possui então um alto-falante para graves e médios- graves e um tweeter para médios-agudos e agudos. O cross-over divide o espectro de frequências do sinal de entrada em dois sinais separados, com uma freqüência de transição usualmente em torno de 3-4 kHz. Logo, o woofer reproduzirá as freqüências do grave mais baixo, em torno de 30-50 Hz até a freqüência de transição, onde o tweeter começa a receber o sinal de áudio, indo de 3-4 kHz até o final do espectro audível, em torno de 20 kHz (algumas caixas de qualidade superior podem respondem até 30, 40 ou 50 kHz).

Já uma caixa de três vias tem um alto-falante para a reprodução dos tons médios, aqueles ao redor da voz humana. Esse alto-falante recebe sinais usualmente entre 1 kHz e 3-5 kHz. Fica-se então com o woofer respondendo de 30-50 Hz até 1 kHz, o médio com resposta de 1 kHz a 3-5 kHz e o tweeter indo de 3-5 kHz até o final do espectro audível. Claro que estes valores de freqüência de transição são valores usuais e pode haver diferença considerável em certos produtos.

Eventualmente podem existir caixas mais sofisticadas que possuem quatro vias, onde a seção de freqüências médias é dividida em duas partes, e cada uma delas excita um alto-falante dedicado, um maior para as freqüências de médios-graves e outro menor para os médios-agudos. As frequências de corte nesse caso costumam ser em torno de 500 Hz, 2 kHz e 5 kHz. A complexidade do cross-over se reflete no preço de um produto desses, de forma que caixas de quatro vias são menos vistas no mercado. Mas sua performance pode ser surpreendente.

Muitas vezes vemos caixas com três vias e quatro alto-falantes, onde geralmente dois alto-falantes de graves são conectados em paralelo. Essas caixas são conhecidas em sua especificação com três vias, quatro alto-falantes.

Mas qual dessas alternativas é a melhor? Tudo depende do uso, categoria e principalmente preço do produto em questão. Uma caixa para som ambiente, sem pretensões maiores de qualidade pode eventualmente utilizar um único falante de 4 ou 5” do tipo full-range, que reproduz grande parte do espectro audível. Mas este tipo de falante não consegue reproduzir simultaneamente os graves mais baixos e os agudos mais altos, servindo tão somente para reproduzir música ambiente num espectro de freqüências de aproximadamente 100-10 kHz, o que não chega a ser classificado como uma reprodução de qualidade. Naturalmente, existem versões bastante sofisticadas desses alto- falantes full-range, que utilizam muita engenharia e materiais especiais, que podem atingir níveis de resposta e qualidade sonora bastante satisfatórios, com a grande vantagem de se eliminar o circuito do cross-over.

Já caixas bookshelves são usualmente construídas somente com duas vias. Essas caixas são geralmente construídas utilizando-se um woofer de 5, 6” ou no máximo 6.5” e um tweeter. Falantes maiores já exigem um alto-falante de médios por uma questão de diretividade, que é, em poucas palavras, a forma como o som se dispersa em função da freqüência. Ou seja, graves são sons onidirecionais (não precisam estar direcionados para o ouvido do usuário para serem bem percebidos), enquanto que agudos são sons que tendem a ser direcionais. Por esse motivo, falantes grandes não podem ser conectados somente a um tweeter e precisam de um alto-falante intermediário para que não haja descontinuidade na diretividade. Assim sendo, bookshelves, que são caixas pequenas, não utilizam falantes de 8”, pois nesse caso a caixa já necessitaria de 3 vias e deixaria de ser uma caixa pequena, pelo tamanho do woofer e da respectiva caixa e também pela necessidade de 3 alto-falantes. Logo, caixas com falantes de 8” ou maiores tendem a ser do tipo torre.

As caixas do tipo torre são caixas apoiadas no chão e utilizam ao menos três vias, conforme discutimos acima. Geralmente elas possuem woofers, com tamanho igual ou maior do que 6”, um médio e um tweeter. Muitas dessas caixas possuem dois woofers de tamanho intermediário trabalhando em conjunto, de forma a terem uma resposta mais estendida e profunda nos graves.

Caixas do tipo bookshelf têm a grande vantagem de, ao serem complementadas com um subwoofer, apresentarem uma performance muito similar ou até superior a de caixas torre sem o complemento do subwoofer. Já as caixas torre podem eventualmente dispensar o uso de subwoofer ativo, mas com certeza terão a desvantagem de necessitar utilizar amplificadores bastante potentes para excitá-las. Já se adicionarmos um subwoofer a uma caixa torre de boa qualidade teremos uma performance bastante superior.

E as arandelas? Basicamente temos o mesmo cenário, arandelas para som ambiente podem possuir um único alto-falante, ao passo que arandelas com falantes maiores possuem duas ou três vias, e tudo depende da qualidade desejada. O autor já ouviu arandelas com qualidade muito boa, mas elas sempre precisam do auxilio de um subwoofer, pois a alinhamento utilizado (defletor infinito), tem naturalmente uma resposta mais pobre em graves que uma bookshelf ou torre de boa qualidade. 

Hoje ficamos por aqui. Até mais!

domingo, 19 de março de 2017

Tudo o que você precisa saber sobre potência de saída de áudio



Mais uma vez volto ao tema, desta vez com dados práticos e não vistos na literatura disponível. O texto deste blog é de relevância para o lojista, usuário ou integrador, pois com a proibição da indicação da potência PMPO pelo INMETRO e a consequente oficilização da potência RMS, que deve ser unicamente declarada nos produtos de áudio e vídeo, começaram a aparecer no mercado diversas formas de declarar essa potência RMS, sem que se indiquem maiores detalhes ou qual é a forma de medição. 

Na realidade, só existe uma forma de declarar potência RMS no Brasil: é a potência RMS medida pela norma IEC60268-3, que tem a norma brasileira NBR IEC60268-3 Edição 05-2011 como uma tradução da européia com poucas diferenças. Procure nas especificações dos fabricantes e você contará nos dedos de uma única mão quem declara a potência RMS de acordo com a norma.

O problema é que hoje há, no mercado, várias formas de declarar potência RMS. As formas mais usuais são:
   Potência RMS: sem detalhes adicionais, ela não quer dizer nada, pois aceita qualquer coisa, inclusive múltiplos da potência real RMS. Falta informação para deixar a coisa correta e nessa condição qualquer valor pode ser publicado. Veja a foto abaixo de um caso extremo fotografado pelo autor.
Potência RMS Contínua (normatizada): é a indicada na norma descrita acima, onde há parâmetros para a medição e sua declaração. Esta é a forma que o Inmetro esperava que todos os fabricantes usassem.
   Potência RMS Máxima:  é uma potência que alguns fabricantes declaram, que não é normatizada e que se convencionou ser o dobro da potência RMS contínua. Na realidade, essa potência nunca é obtida na prática em uso normal, e portanto trata-se apenas de um número inatingível em uso.

Vamos então comparar potência RMS Contínua e RMS Máxima na prática.

Para isso vamos analisar um produto AAT que fornece senoidalmente 60 W RMS. Abaixo temos um plot da tensão na carga com frequência senoidal de 1 kHz. 



O próprio equipamento de medição nos indica a tensão RMS correspondente a esse sinal, que está ligeiramente acima do ponto de clipping (valor máximo de potência do amplificador sem ceifamento da senóide), para tornar facilmente visível o ponto máximo.

Temos aí 22.2 VRMS, o que dá exatos 61.6 W RMS contínuos em 8 ohms a pouco mais de 1% de distorção. Essa é uma potência RMS real, contínua e com a distorção declarada de acordo com os valores ideais descritos na norma IEC. 

Agora vejam outra medição do mesmo produto: 



Nesse caso levamos o sinal de entrada a um valor bem superior ao especificado pelo produto de forma que a onda senoidal se transforma em um sinal clipado que se aproxima de uma onda quadrada. O equipamento de medição novamente vai nos indicar qual a tensão RMS obtida nessa situação, que é de 30.3 V RMS em 8 ohms, o que dá 114.8 W RMS máximos.
Conseguimos, somente com um artificio de medição, levar a potência RMS de 62W a 115W,  um aumento de 1.86 vezes. O que vemos como prática de mercado é que a potência RMS máxima é o dobro da potência RMS contínua. Imagine agora o que pode ser feito ao não se declarar o método de medição. Qualquer coisa vale. Temos abaixo um exemplo fotografado pelo autor (acervo pessoal):



Pergunto: você acredita nisso??? São 25.3 KW (!!!)
Lembro que a potência máxima obtida de uma tomada elétrica comum no padrão brasileiro de pino fino (cujo diâmetro é de 4 mm), em 120 V é 1200W. Um produto que usa este tipo de plug deve no máximo (com 100% de eficiência) ser limitado a este valor de 1200W. Um valor real considerando um produto muito eficiente é 1000 W RMS, no melhor caso.

Na dúvida, veja a declaração de potência consumida pelo produto no painel traseiro (quando ela existe - há casos em que o fabricante não declara esse valor). Qualquer produto não pode fornecer mais potência do que entra pela tomada.
 
Muitas pessoas me falam das potências declaradas nos aparelhos vendidos em grandes magazines, que são falsas e muito infladas. É fato, elas sempre foram e sempre serão. Apenas trocou-se a potência PMPO pelo RMS e os valores continuam inflados. Mas fique atento que no canal especializado há muita coisa inflada também. Hoje tem gente declarando 4500W RMS num produto portátil

Pergunto de novo: você acredita nisso?