Na última postagem, falamos sobre os divisores
de frequência ativos e passivos, utilizados para efetuar a separação de freqüências
necessária para a correta operação dos alto-falantes. Vimos também que existe uma
melhoria significativa de qualidade ao se utilizar cross-overs ativos em
projetos mais sofisticados. Essa melhoria cobra seu preço em termos de
complexidade e custo da instalação, com o uso de um cross-over ativo e de mais
amplificadores por canal. A solução ativa não é vista em Home-theater, ainda tem
pouca visibilidade em sistemas estéreo, mas é comum em sistemas profissionais,
seja nos PA’s (Public Address ou em sistemas para shows), como também em
estúdios de gravação. Caixas do tipo monitor de estúdio são invariavelmente bi
ou tri amplificadas e possuem cross-overs ativos, sendo que algumas utilizam DSP´s
(Digital Signal Processors), que além de proporcionar maior precisão nos
filtros, trazem recursos adicionais construídos no software do DSP, que se
somam aos benefícios anteriores. Equalização das curvas de resposta, correção
das deficiências dos alto-falantes e alinhamento temporal são apenas algumas
das vantagens desse conceito.
O mundo do áudio residencial tem aplicado pouco os cross-overs
ativos, mas existem produtos para uso com bi amplificação ou ainda com bi
cabeamento. Qual a diferença entre eles? A complexidade adicional resultante também
vale o benefício?
Bi cabeamento
Vamos começar pelo bi cabeamento. Antes de continuar,
por simplicidade de notação, falaremos de bi cabeamento ou bi amplificação, mas
os conceitos podem ser estendidos para três ou mais vias da mesma forma, ou seja,
para tri cabeamento ou tri amplificação e assim sucessivamente.
Nessa configuração utiliza-se um amplificador, que é
conectado a uma caixa acústica que permite bi amplificação (ou seja, esta tem quatro
terminais, dois para ligar a via de graves e dois para ligar a via de agudos),
através de um par de cabos. Dessa forma, o sinal de baixa frequência que está
disponível na saída do amplificador trafega até a caixa pelo cabo conectado à
entrada de graves e o sinal de médias e altas freqüências trafega até a caixa
pelo cabo de médios e agudos. Ou seja, o cabo que conduz os graves não conduz
médios e agudos e vice-versa. A vantagem
da configuração, dizem, é que há menos interação entre os sinais que trafegam
em cabos separados. Será isso realmente procedente ou será apenas mais uma dos
grandes mitos do áudio?
Apesar de existirem pessoas que acreditam realmente
que há uma pequena melhora na qualidade da reprodução assim obtida, o fato é
que a diferença, se existir, é pequena e difícil de ser notada. A questão é
que, do ponto de vista de engenharia, levar o sinal por um cabo ou por dois
cabos da forma apresentada acima não gera nenhuma alteração do ponto de vista elétrico
e, portanto, acústico, a não ser que o cabo esteja mal dimensionado ou for de
baixíssima qualidade. Logo, alterações para melhor são difíceis de justificar. Fisicamente sabe-se que cabos são elementos
bastante lineares. Portanto, não faz diferença alguma, do ponto de vista elétrico,
usar um cabo ou dois cabos saindo do mesmo amplificador e chegando à mesma
caixa acústica. Na realidade, bi cabeamento não produz melhora. Mas também não
provoca piora. É uma técnica inócua. A melhora, se existir, é sutil e geralmente
inaudível.
Já o caso da bi amplificação é outra história. Existem
dois tipos de bi-amplificação: a passiva e a ativa.
Bi amplificação ativa
Conforme discutimos anteriormente, bi amplificação
ativa envolve o uso de um crossover ativo que divide o espectro do sinal de áudio
em baixas e altas freqüências. Isso ocorre antes dos amplificadores, e
consequentemente permite que cada canal do amplificador somente receba e reproduza
as freqüências destinadas a ele. Com isso, eliminam-se os cross-overs passivos
das caixas, o que já causa alguma melhora. O fato de cada amplificador estar
diretamente conectado ao alto-falante faz com que a carga vista por ele seja muito
mais bem comportada do que a anterior, com o cross-over passivo instalado entre
o amplificador e o alto-falante. Isso porque crossovers passivos são cargas
reativas, que não são bem gerenciadas pelos amplificadores e também possuem perdas,
o que faz com que o amplificador “sofra” um pouco mais para acionar o sistema e
esteja mais propenso a produzir distorção. O sistema também se torna mais
eficiente, uma vez que as perdas são menores. Mas o grande benefício da técnica
é dado pela redução da distorção no amplificador, que só tem que amplificar uma
parte do espectro audível. Além disso, se forem utilizados dois amplificadores
iguais para a função, o volume percebido pela potência maior será bastante
nítido.
A separação dos sinais ainda permite um ganho de potência que
teoricamente pode chegar a três dB´s, dependendo de como o sinal musical é
composto, fazendo com que a impressão sonora chegue (teoricamente) ao dobro da
anterior. Na prática, esse ganho pode chegar a um ou dois dB´s no máximo. Esse
assunto é um pouco complexo para ser explicado nesta coluna, portanto não vamos
discutí-lo em detalhes. Todos os benefícios
descritos, se somados, resultam em real
melhoria de qualidade, em troca de um custo adicional.
Bi amplificação passiva
A bi amplificação passiva utiliza os cross-overs
passivos das caixas acústicas que dispõem dos conectores separados para a parte
alta e a parte baixa do espectro sonoro. Nesse caso, cada canal do amplificador
amplifica o sinal completo, que alimenta a parte de graves ou de agudos da
caixa utilizada.
Os benefícios são menos pronunciados do que
no caso anterior, mas existem. A grande vantagem deste método é que cada
amplificador enxerga em seus terminais somente parte da carga que ele veria no
caso normal. Por exemplo, um amplificador conectado à via de agudos, nessa condição,
não veria a via de graves como carga, o que melhora a solicitação de potência sobre
ele, fazendo-o trabalhar numa situação mais confortável. As vantagens dessa
configuração são basicamente a menor distorção gerada pelo amplificador e o
ganho de potência, pois estão se utilizando duas unidades amplificadoras iguais.
Os amplificadores trabalharão um pouco mais folgados, pois não terão a
necessidade de fornecer potência em todo o espectro audível.
Bi amplificação mista
Trata-se de uma configuração bastante vista,
onde o canal de graves tem um cross-over ativo e o canal de médios-agudos
também tem um crossover ativo, porém a separação entre médios e agudos é feita
por meio de um crossover passivo. A vantagem imediata é que os graves, que
demandam mais potência, são alimentados por um amplificador independente e os
médios-agudos por outro. Com isso obtém-se os ganhos citados anteriormente sem
a complexidade produzida por um sistema tri amplificado.
Bi amplificação Horizontal e
Vertical
A bi amplificação horizontal e vertical pode
ser aplicada tanto ao caso passivo quanto ao caso ativo. No caso horizontal, um
amplificador é utilizado para acionar a parte de alta freqüência do sistema,
enquanto outro amplificador é usado para a parte de baixa freqüência do sistema.
O benefício imediato é que se especificar amplificadores que trabalhem melhor
com o canal de graves ou com o canal de agudos, através da seleção deles com base
em seus parâmetros e potências. No caso vertical, os dois canais de um mesmo
amplificador são utilizados para empurrar tanto a parte alta quanto a parte
baixa do mesmo canal. Nesse caso, perde-se a oportunidade de escolher
amplificadores que se adequem melhor às necessidades do canal de graves ou de
agudos, mas pode-se trabalhar com o amplificador numa situação um pouco mais
tranquila, dado que o canal de agudos exige menos potência do amplificador.
Existem mais detalhes sobre o assunto, que é
um pouco complicado. As vantagens da bi amplificação ativa são significativas,
especialmente se utilizadas com a configuração horizontal. A complexidade
resultante é maior, mas os benefícios são consistentes e audíveis. No mundo
profissional, este método é bastante utilizado. Quem tiver curiosidade de saber
como se comporta um sistema desses, visite uma loja especializada em áudio
profissional e peça para ouvir uma caixa monitor de estúdio ativa. No mercado
de áudio automotivo, temos notado a disseminação do uso, mas no mercado
residencial ainda são poucos os que o adotam. Em home-theater, a complexidade
adicional gerada pelos amplificadores necessários para os diversos canais de um
sistema típico multicanal ainda deve manter a bi amplificação longe desse
mercado, mas em sistemas estéreo com 2.1 canais ele é perfeitamente realizável,
ao custo de um pequeno aumento de complexidade.